Esta é a terceira parte do especial sobre a série em dois episódios do Globo Repórter que foi ao ar nos dias (18 e 25 de maio), produzida em homenagem aos 110 anos da imigração japonesa no Brasil.
Segundo maior aglomerado urbano do Japão, a Região de Kansai abriga algumas das mais importantes cidades do país, dentre elas Osaka e Kyoto, que foi capital do Japão por mais de mil anos. Também ficam em Kansai localidades de grande importância histórica como Nara, que também foi capital do país. Wakayama, a província menos conhecida da região, tem suas rotas de peregrinação designadas como Patrimônio da Humanidade, assim como Kyoto e Nara que possuem listas de templos e santuários com o mesmo reconhecimento dado pela UNESCO.
Outro Patrimônio da Humanidade em Kansai é o Castelo de Himeji, mostrado com grande destaque no especial do Globo Repórter. Himeji fica na província de Hyogo, a cerca de 40 minutos de Kyoto. A história do castelo começa no século 13 e ganha mais corpo três séculos depois. A construção resistiu ao tempo, às guerras entre os senhores feudais mais poderosos da história japonesa e até aos bombardeios da Segunda Guerra Mundial. Mas quase sucumbiu à sanha de modernização da Era Meiji, quando o governo decidiu demolir a construção. Graças aos esforços de um coronel do exército, o castelo foi preservado e é uma das construções medievais mais adoradas pelos japoneses.
Castelo de Himeji: ainda mais belo na época da floração das cerejeiras
(imagem: Roberto Maxwell)
Como a reportagem de Márcio Gomes mostra, o Castelo de Himeji tinha uma estratégia de proteção secreta: para entrar na construção principal é preciso atravessar um labirinto, o que daria tempo suficiente para a organização da defesa e, quem sabe, até para um contra-ataque. Muito bem preservado, o Castelo de Himeji é uma viagem pelo Japão do xogunato Tokugawa. Vizinho ao castelo, fica o Koko-en, um belíssimo jardim japonês que vale muito a visita. Até porque o tíquete que permite a visita aos dois espaços custa ¥1.040, apenas 40 ienes a mais do que a entrada do castelo.
Antes de seguir para Kyoto, seu local de pernoite, use o JR Pass para dar uma passadinha em Osaka ou Kobe. Duas das maiores capitais de Kansai, ambas as cidades têm atrativos de sobra para quem quer conhecer melhor o Japão.
Estando em Kyoto, você pode querer se hospedar no Mume, um hotel-boutique que encabeça a lista dos preferidos pelos usuários do site Trip Advisor. Disputadíssimo, o estabelecimento tem uma diária mínima de ¥22.000. Pense em, no mínimo, quatro diárias (¥88.000) para visitar com calma todas as atrações de Kyoto que aparecem no programa.
Kyoto e as refinadas tradições japonesas
Kyoto tem todas as credenciais para ser a grande arca dos tesouros culturais do Japão. Os mais de dez séculos como sede da corte, fez com que a cidade atraísse os melhores artesãos e artistas, as seitas religiosas mais poderosas e muito mais. Arquitetura, arte, literatura, gastronomia, vestuário: tudo que há de melhor e mais tradicional no Japão marca presença em Kyoto. E a cidade brilhou ainda mais no programa graças ao olhar atento do repórter cinematográfico Luciano Tsuda e seus 21 anos no país.
Márcio Gomes começa mostrando a cidade em um passeio no Sagano Romantic Train, um serviço especial que parte de estações JR mas não está incluído no JR Pass. Os charmosos trens antigos partem da estação Saga-Arashiyama e vão até Kameoka, num percurso de 7 km às margens do Rio Hozu. A passagem custa ¥620.
Voltar de trem para Arashiyama é possível mas desfrutar a vista num passeio de barco tem sido a principal opção de quem faz o passeio. Os barcos partem de um pier que fica a 15 minutos de ônibus da estação Torokko Kameoka (¥310). O passeio no barco tradicional custa ¥4.100 por pessoa.
Do ponto final do barco, a Ponte Togetsu, uma caminhada de alguns minutos leva até a Floresta de Bambu, uma das mais conhecidas paisagens de Kyoto. Por conta do enorme número de turistas, tem sido cada vez mais difícil embarcar no clima etéreo apresentado na reportagem. Além disso, a icônica floresta também tem sido alvo de vândalos que riscam as árvores. Sendo assim, se você quiser apreciar o local tranquilamente deve chegar cedo, por volta das sete da manhã. De repente, a Floresta de Bambu pode ser o começo do passeio por Arashiyama, antes do embarque no Sagano Romantic Train.
Montanhas de Arashiyama com a Ponte Togetsu: cenário rural em Kyoto.
(imagem: Roberto Maxwell)
Ali bem pertinho fica o Santuário Nonomiya de onde parte o Saiku Gyoretsu, uma procissão que representa a jornada das princesas até o Santuário de Ise, onde elas se tornavam sacerdotisas. A tradição de enviar moças da família imperial para Ise começou no final do século 7 e durou até o século 14. De acordo com a lenda, a cerca de 2.000 anos a Princesa Yamatohime-no-mikoto saiu em peregrinação para encontrar um lugar de adoração permanente para Amaterasu, a deusa do sol. Depois de 20 anos de busca, a princesa encontrou na atual Mie o local onde hoje fica o Grande Santuário de Ise. Essa sacerdotisas de sangue azul eram chamadas de saio e a procissão em sua memória é realizada todo terceiro domingo do mês de outubro em Kyoto.
Um santuário que celebra a antiga capital
Outro dos lugares sagrados de Kyoto que aparecem na reportagem é o Santuário Heian. Fundado em 1895, no aniversário de 1.110 anos da cidade, o santuário é dedicado ao primeiro e ao último monarca a reinar o país enquanto Kyoto foi a capital japonesa: Kammu e Komei, respectivamente. Para este dia, aposente o JR Pass e compre o passe de ônibus de 1 dia que custa ¥600.
No Heian, tudo é saudade. O santuário foi batizado com o nome da cidade à época em que se tornou capital, mas especificamente o ano de 794. Foi o início de um período histórico muito importante para a formação do povo japonês que, até então, absorvia como uma esponja todas as novidades que chegavam da China: da gastronomia à religião, passando pela arquitetura e pelas artes. Durante o Período Heian que, por exemplo, foram criados os silabários que hoje se somam aos ideogramas chineses na escrita da língua japonesa. Isso proporcionou o acesso de mais gente à escrita e a criação de uma literatura genuinamente japonesa.
Até na arquitetura o Santuário Heian propicia uma volta a esse momento histórico. Suas construções principais são representações em escala menor do Palácio Imperial do Período Heian. O santuário conta, ainda, com um belo jardim com plantas, lagos e construções tradicionais. Na primavera, as cerejeiras-choronas dão o espetáculo, florindo um pouco depois de suas primas, o tipo mais comum no Japão. Apesar da entrada no santuário ser franca, a visita ao jardim custa ¥600.
No dia 22 de outubro, o santuário organiza o Jidai Matsuri, um festival que celebra o aniversário da cidade. No evento, os participantes desfilam com roupas e acessórios de diversos momentos da história japonesa numa parada que começa no Palácio Imperial de Kyoto e segue até o Santuário Heian.
Cidade das gueixas (oops!)
Bem, se estamos falando de Kyoto é melhor começar corrigindo logo no começo: na antiga capital japonesa essas figuras tão simbólicas do Japão são chamadas de geiko (leia o ge como gue). Artistas cercadas de mistérios, as geiko são especialistas em entreter através da mais fina música, da dança mais delicada e de jogos simples e divertidos.
No programa, a equipe do Globo Repórter conheceu a Koyoshi, uma maiko — aprendiz de geiko — que está se especializando em canto e no koto, um instrumento de cordas japonês. Apaixonada por leitura e pelo teatro kabuki, Koyoshi ainda tem um tempo pela frente até se tornar uma geiko. Mas ela pode ser vista atuando no Bar Morita, em Miyagawa-cho, um dos cinco kagai — distritos de gueixas — ainda em atividade em Kyoto. Além de vinhos e saquês de boa qualidade, o local tem salas de karaokê que podem ser usadas pelos visitantes. No Tabelog, o bar está listado na faixa de preços entre ¥10.000 e ¥14.999. Como o site está todo em japonês, não espere atendimento em outra língua.
Se você prefere um programa mais seguro, feito sob medida para turistas estrangeiros, pode optar pelo banquete do Yasaka-dori Enraku, com gastronomia tradicional de Kyoto, incluindo bebidas, e apresentações de maiko. O visitante também tem um tempo para tirar foto e conversar com as artistas, com a ajuda de intérpretes. Tudo isso por ¥19.000. É uma oportunidade ímpar para conhecer de perto uma das mais tradicionais manifestações artísticas do Japão.
Belezas de cartão postal
Se um gênio aparecesse na sua frente e te desse a chance de conhecer apenas dois lugares em Kyoto você deveria escolher o Kinkakuji e o Santuário Fushimi Inari. Aqui, além do JR Pass, você deve separar ¥600 em moedinhas para o passe de ônibus de um dia.
Conhecido como Pavilhão Dourado, o Kinkakuji consegue ser singelo e impressionante ao mesmo tempo. Trata-se de uma construção de três andares, com estilo arquitetônico misto, à beira de um lago com um paisagismo impressionante. Seria apenas mais um prédio bonito e singelo se ⅔ dele não fossem folheados a ouro. O mais impressionante, no entanto, é que não estamos falando daquela sensação de queixo caído causada pela ostentação, muito comum em templos ao redor do planeta. No Kinkakuji, falamos de beleza, delicadeza e harmonia de uma forma que raramente é associada ao metal mais cobiçado do mundo.
Antes, uma das residências de um rico mercador, passou para as mãos do xogum Ashikaga Yoshimitsu e foi transformada em espaço sagrado com a sua morte, em 1408. A construção atual é bem mais recente, de 1955, renascida das cinzas como a fênix no seu topo, após ter sido posta em chamas por um monge lelé da cuca. Não se deixe seduzir pela instagramabilidade do local, nem se irrite com as centenas de turistas loucos por uma “boa foto”. Aprecie cada centímetro da vista porque a visita vale cada um dos ¥400 pagos como entrada.
Localizado em outra ponta da cidade, o Fushimi Inari é um santuário xintoísta dedicado ao deus do arroz, representado por aqui pela raposa. Religião nativa do Japão, o xintoísmo é baseado no culto à natureza e aos ancestrais e tem como divindades os kami, seres que regem o mundo além da existência humana. Santuários dedicados a Inari podem ser encontrados em todo o país. Como deus do arroz, Inari também é a divindade da colheita e, em última instância, da prosperidade. Por isso, seus santuários atraem tantos fiéis.
Os portais do Fushimi Inari são uma das imagens icônicas de Kyoto (imagem: Roberto Maxwell)
O Santuário Fushimi Inari que engloba, ainda, o Monte Inari de 233 metros de altitude. O caminho da base até o topo é formado por portais torii na cor vermelha, comuns em templos xintoístas de todo o país. A caminhada completa pode levar até 2 horas e a grande maioria dos visitantes se contenta em visitar apenas a primeira leva de portais. Não é para menos. A belíssima imagem das duas fileiras de portais vermelhos é uma das mais conhecidas e difundidas de Kyoto. Uma memória que não vai sair da sua cabeça mesmo depois de ver o Monte Fuji, o símbolo máximo do Japão, na continuação desta viagem.
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